Câmara de Cuiabá foi oficiada sobre proclamação 1 mês depois; analista vê necessidade de “republicanizar” | RDNEWS
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Ata de relatório da Câmara de Cuiabá mostra que a Proclamação da República do Brasil – que aconteceu em 15 de novembro de 1889 – só foi oficializada ao Parlamento quase um mês depois, em 14 de dezembro de 1889. O “atraso” se explica devido às grandes distâncias entre Cuiabá e o Rio de Janeiro, Capital do país, à época. Há registro também em um jornal impresso em Cuiabá entre os dias 12 e 17 de dezembro.
O registro foi consultado pela reportagem do no Arquivo Geral da Câmara de Cuiabá – de acesso público. O professor e analista político, Vinicius de Carvalho, reforça que a Proclamação da República foi fruto de um “golpe” em um período extremamente conturbado da história política brasileira, mas ainda vê influência da Monarquia até os dias atuais da “jovem República”, que completa apenas 135 anos. O analista explica que a essência do termo “República”, vem do latim, “res publica”, sendo traduzido como “coisa pública”, onde o interesse coletivo deve prevalecer.
Na sua avaliação, de fato, a destituição do imperador Dom Pedro II provocou uma mudança política através da força, tendo parcela de apoio da sociedade civil – escravos, elites emergentes e militares. Mas, a herança segue latente, em exemplos como ações e vocabulário, sendo necessário que ocorra uma nova “republicanização” para que posturas “corruptas” e impróprias sejam deixadas de lado: “A nossa cultura é muito monárquica, muito do rei, o rei está encima, o rei está em outro patamar, o rei não dialoga com os súditos, com os comuns, é uma cultura muito autoritária. E você isso nos prédios públicos, que são chamados de Palácios”, reflete.
“Embora sejamos nominalmente uma República, ela vai completar 135 anos, mas a nossa cultura política é muito monárquica, então o nosso desafio continua sendo republicanizar a República. Ela tem muito patrimonialismo, que não tem coisa de todos, muito cargo comissionado, muita corrupção, isso não é república, isso é antirrepublicano, é uma questão patrimonialista. Pegar uma parte do público e transformar em algo privado: ‘Essa parte aqui é minha, não é público’. Esse desafio continua presente, de republicanizar a república, de aprofundar o espaço que é de todos. A cada ano é uma oportunidade de refletir sobre isso”, destaca o analista.
Rodinei Crescêncio
Analista Vinicius de Carvalho reflete que “nossa cultura política é muito monárquica, então o nosso desafio continua sendo republicanizar a República”
Com a queda da Monarquia, o general alagoano, Marechal Deodoro da Fonseca, tornou-se o primeiro presidente do Brasil. Quando a notícia chegou até a Câmara de Cuiabá, os vereadores agradeceram a informação, realizaram votos de confiança e demonstram seu apoio ao Sr. General Antônio Maria Coelho, governador de Mato Grosso à época, reforçando o compromisso de garantir o nascimento e consolidação do Estado dentro do novo regime, diante da transição de província para estado.
“A Câmara Municipal tem a honra de anunciar ter recebido hoje o ofício de Vossa Excelência, pela qual declarou ter a ata chegada a esta Capital […]. A comunicação de ser proclamado no Brasil a República Federativa sob a denominação de República dos Estados Unidos [do Brasil] e estabelecido no Rio de Janeiro um Governo Provisório sob a presidência do General Marechal Deodoro da Fonseca desde o dia de 15 de novembro”, diz trecho do documento oficial.
Os primeiros pilares do novo modelo político instaurado no país, são pautados pelo presidencialismo, o federalismo e as Câmara dos Deputados e Senado, sendo diretrizes que seguem até os dias atuais, divididas entre Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Ainda há a separação da Igreja e Estado, e o direito voto, que passou a ser ampliado a partir desse período.
Arquivo Público/Reprodução G1
Momentos de instabilidade
Vinicius pontua ainda que a República brasileira, na sua avaliação, possui três movimentos. Ele expõe ainda que a “Era Getúlio Vargas”, com o Estado Novo e a Ditadura Militar, foram regimes que interferiram na democracia do país – demonstrando certa vulnerabilidade no modelo republicano. Nos dias atuais, as instituições possuem mais força do que em tempos passados, assegurando autonomia e a governabilidade, mesmo com algumas tentativas recentes, como o 8 de janeiro de 2023 – movimento que invadiu a sede dos Três Poderes, no Distrito Federal, para contestar o resultado das urnas e um governo democraticamente eleito.
“Nós estamos na terceira República, a primeira, foi a de 1894, com Prudente de Morais [primeiro presidente eleito pelo voto], chamada de República Velha. A segunda República de 1946 até 1964. E a terceira, de 1985 para cá, com o marco jurídico de 1988 com a Constituição Federal. A gente exclui às ditaduras, onde tivemos duas, com Getúlio Vargas [de 1930-1933 (Governo Provisório); 1934-1937 (Governo Constitucional); 1937-1945 (Estado Novo) e 1950-1954 (2º mandato presidencial)], com o ‘Estado Novo’ e a Ditadura Militar de 1964 a 1985. Estes [dois recortes] não seriam repúblicas, porque República, é democrática. Esses períodos foram ditatoriais, e eu me alinho a essa ideia, de que estamos na terceira República”, pontuou.
Hugo Barreto/Metrópoles
Ataque aos 3 Poderes em 8 de janeiro de 2023
Feriado esvaziado
Embora compreenda a importância de 15 de novembro, o professor pertence à uma ala que vê a data “esvaziada”, ou seja, um feriado que não está em sintonia com a população. Como exemplo, ele cita que o dia 7 de setembro, Independência do Brasil, possui mais apelo popular, diante dos ritos como o desfile cívico militar. O analista reflete que, além da simbologia de “patriotismo”, que no momento de polarização entre esquerda x direita se acirrou ainda mais – há engajamento popular.
“O 7 de setembro tem um pouco mais de apelo, na prática, são feriados esvaziados. Por mim, poderia ser até abolido, eu trocaria o 15 de novembro pelo dia 20, de Consciência Negra, que virou feriado nacional […] O dia 20 a gente celebra o povo, a maioria do povo, que são os negros. No dia 15 você celebra o próprio Estado, uma coisa esvaziada, seria um momento para refletir, mas [perdeu o sentido]. No 7 de setembro ainda há os ritos como desfile”, finaliza.
FONTE: RDNEWS
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